A tradição das cinzas como sinal de penitência remonta à Bíblia Hebraica. No Livro de Jonas, (3.5-8), o ritual é descrito com detalhes. Em sinal de arrependimento, o rei de Nínive proclama um jejum. Ele e as pessoas em Nínive rasgam as vestimentas bonitas, vestem-se de panos de saco e sentam-se sobre cinzas. Até os animais domésticos devem seguir este rito.
No Primeiro Livro dos Reis (21.27) ocorre um rito semelhante: em sinal de arrependimento, o rei Acabe rasga suas vestes, cobre-se de pano de saco, jejua e dorme sobre panos de saco. Aqui, porém, as cinzas não são mencionadas. Também Jó (1.20), após perder tudo o que tinha, rasga seu manto, raspa a cabeça e se lança em terra. Mais adiante (2.8) senta-se em cinzas. Aqui não se trata de arrependimento, mas de uma espécie de luto pelo que se perdeu.
A Igreja assumiu essa tradição. A partir do século VII, já se conhece a Quarta-Feira de Cinzas como o início da Quaresma, o período de jejum que antecede a Páscoa. É tempo de penitência, em preparação à festa da Ressurreição.
Na Quarta-Feira de Cinzas, os penitentes são vestidos com roupas penitenciais, cobertos de cinzas. A partir do século X, passa-se a consagrar as cinzas. Mais tarde, em torno de 1090, clérigos e leigos são marcados na testa com uma cruz feita de cinzas obtidas de ramos guardados desde o Domingo de Ramos do ano anterior.
O tempo de penitência e de jejum irá durar quarenta dias, a contar da Quarta-Feira de Cinza, terminando no Sábado de Aleluia. Não se contam os domingos, pois cada um deles lembra a Ressurreição de Jesus. Não se pode jejuar no dia da maior alegria cristã.
Pela tradição israelita, assumida pelos cristãos, o domingo começa às 18h de sábado, estendendo-se até às 18h de domingo. Assim, o jejum é suspenso no sábado à noite e retomado ao anoitecer de domingo. Não há, pois, nada de errado em alegrar-se e festejar no sábado à noite e no dia de domingo.
Por último, vale lembrar o significado do jejum. Não se trata de dieta para emagrecer ou desintoxicar, ainda que isto seja um benefício adicional. Trata-se mesmo de deixar de comer algo que se irá dar para quem nada tem de comer. O que eu não como irá beneficiar alguém que passa fome constantemente.
É interessante que, até hoje, algumas famílias negras fazem churrasco na Sexta-Feira Santa. É que, no passado, senhores brancos cristãos deixavam de comer carne naquele dia e a davam a seus escravos, que, então, podiam alegrar-se com aquele presente, fruto do jejum.
P. Dr. Carlos Arthur Dreher
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