Gosto de viver no meio do rebanho. As ovelhas são muito
tranquilas. Elas raramente criam conflitos. Mas são indefesas. Não sabem correr
como lebres e gazelas e não se defendem com mordidas, nem dão coices ou
chifradas. Por isso, nós pastores cuidamos delas, de dia e de noite.
Sim, eu gosto das ovelhas, mas a minha
vida não é fácil. Nós pastores enfrentamos noites frias e faltam-nos abrigos
seguros e agasalho que aquece.
Nós somos peões e temos poucos direitos.
O pior de tudo é que nos excluem do templo, das celebrações e da comunhão com
Deus. As pessoas do bem, que se dizem puras, nos marginalizam. Sua religião
ensina que somos impuros porque lidamos com animais.
De uns dias para cá, acontece algo de
extraordinário. Aparece uma luz. Sim, a mais clara de todas as luzes! Ela vem
acompanhada de uma mensagem que nos enche de esperança: Não tenham medo!
Que coisa estranha e maravilhosa! A luz
aponta um estábulo onde está um menino, e seu berço é o coxo onde comem os
animais.
O medo acompanha minha vida desde sempre.
Nossos patrões são ásperos conosco, e suas mãos são pesadas no castigo. Eles
bajulam nosso prefeito Quirino, um soldado guerreiro e rápido com a espada. Ele
veio para fazer um recenseamento, porque o Imperador Romano quer saber quanto
imposto pode cobrar do nosso povo. Se ele aumentar os impostos, os donos dos
rebanhos vão demitir muitos pastores e descontar o imposto nos nossos salários.
E ainda tem o nosso Rei Herodes, um tirano que se mostra muito religioso, mas
que é apaixonado por armas, tem falas violentas e governa com ameaças.
Começo a entender por que a brandura do
menino tira o medo de mim. Creio que nasce com ele uma forma nova de viver: Sua
fofura vence a rudeza. Sua ternura acolhe e não me exclui. Seu sorriso convida
e não ameaça. Seu olhar meigo me toca. Cada dia, o menino cresce um pouco
dentro de mim. Se crescer em muitos de nós e nos poderosos, meu medo vai
desaparecer.
P. Silvio Meicke
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