"A minha avó dizia-me que quando uma mulher se sentisse
triste, o melhor que podia fazer era entrançar o seu cabelo; de modo que a dor
ficasse presa no cabelo e não pudesse atingir o resto do corpo. Havia que ter
cuidado para que a tristeza não entrasse nos olhos, porque iria fazer com que
chorassem, também não era bom deixar entrar a tristeza nos nossos lábios porque
iria forçá-los a dizer coisas que não eram verdadeiras, que também não se
metesse nas mãos porque se pode deixar tostar demais o café ou queimar a massa.
Porque a tristeza gosta do sabor amargo.
Quando te sintas triste menina- dizia a minha avó- entrança
o cabelo, prende a dor na madeixa e deixa escapar o cabelo solto quando o vento
do norte sopre com força. O nosso cabelo é uma rede capaz de apanhar tudo, é
forte como as raízes do cipreste e suave como a espuma do atole.
Que não te apanhe desprevenida a melancolia minha neta,
ainda que tenhas o coração despedaçado ou os ossos frios com alguma ausência.
Não deixes que a tristeza entre em ti com o teu cabelo solto, porque ela irá
fluir em cascata através dos canais que a lua traçou no teu corpo. Trança a tua
tristeza, dizia. Trança sempre a tua tristeza.
E na manhã ao acordar com o canto do pássaro, ele encontrará
a tristeza pálida e desvanecida entre o trançar dos teus cabelos…"
Rui Sá
Nenhum comentário:
Postar um comentário